Kleber administrou Cerejeiras entre 2009/2012
Kleber administrou Cerejeiras entre 2009/2012

Atendendo pedido do Ministério Público Eleitoral (MPE), a Justiça Eleitoral impugnou a candidatura de Kleber Calisto de Souza (PMDB), que tenta chegar mais uma vez a ocupar a principal cadeira do executivo de Cerejeiras.

A decisão foi proferida nesta segunda-feira, 29, pelo Juiz Eleitoral Bruno Magalhães Ribeiro dos Santos.

O ex-prefeito foi enquadrado na lei do “Ficha Limpa”. Na justificativa, o magistrado explicou que “não restaram satisfeitas todas as condições legais para o registro pleiteado, já que, nos termos dos documentos e julgamentos mencionados, encontra-se o interessado ainda inelegível pelo prazo legal de 8 (oito) anos”.

Ouvido pelo Extra de Rondônia, Kleber Calisto disse que respeita a decisão da justiça, mas vai recorrer ao Tribunal Regional Eleitoral. Kleber Calisto, que administrou Cerejeiras entre 2009/2012, tem como vice o médico Ademir Cruz (PSB).

> > CONFIRA, ABAIXO, A DECISÃO NA ÍNTEGRA

 

Autos n.º 240-61.2016.6.22.0016

Requerimento de Registro de Candidatura

Requerente: KLEBER CALISTO DE SOUZA

 

Trata-se de pedido de registro de candidatura de KLEBER CALISTO DE SOUZA ao cargo de Prefeito, vinculado ao DRAP n. 239-76.2016.6.22.0016, pelo(a) coligação UM NOVO TEMPO, Município de Cerejeiras/RO.

Foram juntados os documentos exigidos pela legislação em vigor, embora haja notícia acerca de suposta inelegibilidade a pesar sobre o requerente.

Publicado o edital, houve impugnação pelo Ministério Público e por NEREIDE JOSÉ ALVES DA CRUZ, candidato a vereador nas mesmas eleições, ambas ao semelhante argumento atinente a subsistir inelegibilidade legal na hipótese. O impugnado contestou as impugnações. A Coligação respectiva manifestou-se sobre o pedido.

É o relatório.

Decido.

O feito comporta imediato julgamento, nos termos do NCPC, art. 355 e Res. TSE 23.455, arts. 41 e ss, já que trata-se de matéria de direito, e as provas documentais a ela inerentes já residem nos autos, despiciendas, para a convicção do juízo à luz da natureza das questões aventadas e da prova documental carreada, quaisquer outras diligencias.

  1. Questiona-se nos autos subsistir suposta causa de inelegibilidade a pesar sobre o pretenso candidato às eleições majoritárias do município, diante de previa condenação por imputação de ato de improbidade administrativa, e correspondente sanção de suspensão de direitos políticos, com prazos legais ainda em curso diante da realidade da anterior condenação, ainda pendente de trânsito em julgado.
  2. Ausentes questões prejudiciais, ao mérito doravante, para a análise do qual de logo cumpre assentar importantes premissas fáticas, descortinadas da prova documental colacionada.

AS PREMISSAS DE FATO

  1. a) Em 03/09/2008 Kleber Calisto foi condenado por sentença em primeiro grau de jurisdição, como incurso nas sanções da LIA, por ter perpetrado ato de improbidade administrativa referido no art. 10 I da lei n. 8429/92 (prejuízo ao erário); dentre as sanções cominadas pelo juízo, adveio pena de suspensão dos direitos políticos pelo prazo de 5 (cinco) anos;
  2. b) Em acórdão datado de 22/04/2010, o Egrégio TJRO manteve a condenação, caracterizando, pois, a primeira decisão de órgão colegiado sobre a lide;
  3. c) Em 12/11/2013, o STJ negou provimento ao recurso do réu, e, em 02/08/2016, o Egrégio STF negou procedência à Ação Cautelar destinada a conferir efeito suspensivo às anteriores decisões, especificamente acerca da pena de suspensão dos direitos políticos, e afastar a inelegibilidade incidente sobre o condenado, estando o processo, a partir de então, a aguardar o trânsito em julgado, ainda não observado;
  4. d) Em 2010 adveio a alteração legislativa consubstanciada na LC n. 135/2010, estabelecendo novas causas e prazos de inelegibilidades, e, em julgado definitivo, publicado em 29/06/2012, o STF, ao julgar conjuntamente a ADC 29, ADC 30 e ADI 4578, pacificou tormentoso tema pertinente à incidência de causas legais de inelegibilidade, declarando que a LC 135/2010 – denominada “Lei da Ficha Limpa” , que traz novas hipóteses e prazos de inelegibilidade, nos termos dos arts. 14 e 15 da CF/88 – é constitucional, e que suas prescrições aplicam-se inclusive a fatos ocorridos anteriormente à sua vigência, não se havendo de falar em afronta à cláusula pétrea da irretroatividade nos termos da CF/88, embora se devesse excluir de sua incidência as eleições de 2010, e os mandatos então em curso. Assentou, de resto, outros importantes pilares sobre o tema.
  5. e) Ainda que se considere já se ter expirado o prazo de suspensão dos direitos políticos do interessado nos autos, cominado pela primeira decisão colegiada – 5 (cinco) anos contados a partir de 22/04/2010, data da primeira decisão colegiada/acórdão que manteve a condenação do 1º grau -, certo remanesce que ainda em curso, à data do pedido de registro da candidatura de Kleber Calisto para as eleições de 2016, se encontra o prazo legal de inelegibilidade trazido pela LC n. 135/2010, de 8 (oito) anos, pois que contados a partir do término do cumprimento da pena de suspensão dos direitos políticos fixada pelo julgado (art. 1º, I, “L” LC n. 64/90), com a ressalva, já pacificada pelo STF, de que pena de suspensão imposta na sentença por força da LIA (art. 15 CF/88) não se confunde com a subsequente cominação de inelegibilidade trazida pela LC 64/90 (art. 14 CF/88), inclusive porque oriundos de comandos constitucionais diversos e autônomos.

AS PREMISSAS DE DIREITO

À luz do específico regramento que a CF/88 e a LC n. 64/90 dedicam ao tema, em cotejo com a documentação trazida, exsurge evidente ainda suportar, aquele interessado, causa legal de inelegibilidade, o que impõe o indeferimento do registro de sua candidatura a prefeito, na campanha eleitoral ora em curso.

  1. Com efeito, derredor do tema de fundo, com vistas à adequada interpretação dos preceitos legais incidentes no caso dos autos aqui já se faz demais oportuna, inicialmente, a lembrança daquela que, sem dúvidas, afigura-se como uma das mais precisas e preciosas lições com as quais a Ciência do Direito foi brindada, descortinada da genialidade de Carlos Cóssio, aquele que, visando a aperfeiçoar a Teoria Pura do Direito do igualmente brilhante Hans Kelsen, desenvolveu a Teoria do Ecologismo Existencial. Como outros importantes cientistas que aperfeiçoaram a teoria kelseniana, Cóssio ensinou que o Direito não se exaure na norma jurídica; Direito é regra de conduta humana, pensada enquanto o relacionar de um indivíduo, com aqueloutros, no bojo de uma sociedade. Direto é, portanto, conduta em interferência inter-subjetiva; visa a disciplinar e limitar o comportamento do indivíduo no trato com os demais, elegendo seus limites, sanções e consequências jurídicas, à luz de valores considerados superiores, elencados em uma Constituição, que situa-se no topo da pirâmide normativa.

Portanto, em apertada síntese, ao regulamentar a liberdade humana e, pois, a conduta do homem em sociedade, o ordenamento jurídico traça regras com fundamento naquilo o que é querido ou praticado na sociedade em determinado momento histórico, para a aferição do qual lançar-se-á mão, se preciso for, da técnica da ponderação de valores previstos na CF/88 – e aqui já se lança holofotes sobre o Direito Constitucional brasileiro e sua moderna roupagem; quando em aparente tensão dois valores igualmente preservados na Carta Magna – v.g. irretroatividade da lei mais severa vs interesse público à moralidade e probidade administrativas necessárias ao exercício do mandato, considerando-se, inclusive, a vida pregressa do candidato à luz da proporcionalidade se há de conferir, no caso concreto, preponderância ao bem jurídico de maior relevância dentre aqueles albergados no texto constitucional. E não se há de duvidar, mesmo, acerca da atual prevalência de tal visão constitucionalista, no arcabouço normativo pátrio, como de há muito manifestam os tribunais superiores.

Pertinente a digressão, quanto a analise da abrangência das LCs 64/90 e 135/2010 – “Lei da Ficha Limpa”  -, em torno dos processos em curso, condenações anteriores e atos pretéritos ao advento da normativa mais gravosa, como no caso dos autos.

É dizer: no tocante aos limites e parâmetros para a incidência da Lei da Ficha Limpa, hão de predominar os princípios da moralidade, da probidade e da legalidade, ao qual tudo o mais há de servir; legalidade, moralidade e probidade não são negociáveis no trato da coisa publica, à luz da CF/88, pois; ainda que em episódico detrimento ao valor segurança jurídica, do qual a cláusula da irretroatividade da lei é serva, tanto mais porque o próprio legislador constituinte, em exercício de previa ponderação de valores, in casu já elegeu serviente o segundo, frente à prioridade dedicada aos demais princípios declinados. Assim já o disse, aliás, noutros termos, o Supremo Tribunal Federal.

Afinal, sintomática a observação de que a LC 135/2010 adveio de autêntica iniciativa popular, já que descortinada do seio social, no qual foram coletadas cerca de 1,3 milhões de assinaturas de brasileiros, para o projeto de lei que seria, então, encaminhado ao Congresso Nacional, e que culminou na sanção presidencial da referida lei. Jamais se haveria de questionar, assim sendo, derredor da legitimidade do referido diploma legal, ou daquilo o que, de fato, corresponde, quanto ao regramento das condutas ali elencadas, à vontade do Constituinte Originário – povo -, visto ter sido dele mesmo – e não dos seus representantes legais no parlamento – a iniciativa direta quanto ao projeto.

Demais relevante o fato, inclusive no tocante à interpretação do caso trazido a estes autos. É dizer: deseja o Constituinte Originário que, sempre que se verificar que um pretenso candidato a qualquer cargo eletivo tenha, em sua “ficha” , prévia condenação judicial, colegiada ao menos, por ato de improbidade administrativa em qualquer comportamento anterior à nova candidatura, seja ele impedido de disputar novo cargo eletivo durante os 8 (oito) anos que se seguirem ao término da suspensão dos direitos políticos fixada na decisão judicial. Assim expressa o teor da LC n. 135/2010.

É isto o que deseja a vontade popular e, pois, a ratio do drástico e rígido diploma legal referido. E aqui, uma vez mais, se há de render homenagens à genialidade de Carlos Cóssio, ao incutir no legislador, de vez, a necessidade de visualização da norma jurídica não como fim em si mesmo, mas apenas como instrumento serviente aos valores impregnados no seio social, através dos quais se pensa – e, pois, se disciplina – a conduta humana naquele momento histórico; tão somente uma das fontes do Direito, pois. Aliás, a lição não foi olvidada pela Min. Carmen Lúcia, quando, embora sob outro prisma, ao proferir o seu voto nas ações constitucionais referidas no julgamento do STF, ressaltou que “a vida é tudo que a gente faz todos os dias. ´E, no caso, o direito traça, marca e corta qual é a etapa e os dados desta vida passada que precisam ser levados em consideração” `. Trata-se, pois, de regramento da conduta, através da norma, sua interpretação e das demais fontes do Direito, inclusive princípios constitucionais, e da moral praticada em certo momento histórico.

Em casos como o dos autos, pois, não deseja, o legislador, que aquilo o que de relevante ou grave fizeram os candidatos, no passado, seja ignorado ao ponto de proporcionar-lhe novas candidaturas em um futuro determinado (prazo legal de inelegibilidade fixado), incompatíveis com a probidade necessária ao mandato que almejam.

  1. Pois bem. Diz o art. 1º , inc. I, al. “l” da Lei Complementar n. 64/90, com a redação que lhe conferiu a LC n. 135/2010:

“São Inelegíveis:

I – Para qualquer cargo:

  1. l) os que forem condenados à suspensão dos direitos políticos, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, por ato doloso de improbidade administrativa que importe lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito, desde a condenação ou o trânsito em julgado até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da pena; (Incluído pela Lei Complementar nº 135, de 2010)”

O teor do texto legal não permite dúvida acerca do termo inicial do prazo legal da inelegibilidade do condenado anterior: o término do prazo de cumprimento da pena atinente à sanção imposta em juízo por força da LIA, que é a suspensão dos direitos políticos, já que o inciso trata especificamente da inelegibilidade decorrente de condenação judicial por improbidade administrativa, que traz as penas especificas por improbidade, a serem aplicadas pelo juízo. Não bastasse, uma vez mais rememora-se dispor, a Constituição da República, serem, as prescrições do art. 14, frente àquelas do seu art. 15, hipóteses e cominações distintas, decorrentes da pretérita violação, pelos pretensos candidatos, de normas e princípios constitucionais ou legais, ainda que eventualmente decorrentes de um mesmo e único ato ilícito.

05 – Pacificando de vez o tema, o acórdão prolatado no julgamento definitivo da matéria, pelo STF, teve a seguinte ementa:

“AÇÕES DECLARATÓRIAS DE CONSTITUCIONALIDADE E AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE EM JULGAMENTO CONJUNTO. LEI COMPLEMENTAR Nº 135/10. HIPÓTESES DE INELEGIBILIDADE. ART. 14, § 9º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. MORALIDADE PARA O EXERCÍCIO DE MANDATOS ELETIVOS. INEXISTÊNCIA DE AFRONTA À IRRETROATIVIDADE DAS LEIS: AGRAVAMENTO DO REGIME JURÍDICO ELEITORAL. ILEGITIMIDADE DA EXPECTATIVA DO INDIVÍDUO ENQUADRADO NAS HIPÓTESES LEGAIS DE INELEGIBILIDADE. PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA (ART. 5º, LVII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL): EXEGESE ANÁLOGA À REDUÇÃO TELEOLÓGICA, PARA LIMITAR SUA APLICABILIDADE AOS EFEITOS DA CONDENAÇÃO PENAL. ATENDIMENTO DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. OBSERVÂNCIA DO PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO: FIDELIDADE POLÍTICA AOS CIDADÃOS. VIDA PREGRESSA: CONCEITO JURÍDICO INDETERMINADO. PRESTÍGIO DA SOLUÇÃO LEGISLATIVA NO PREENCHIMENTO DO CONCEITO. CONSTITUCIONALIDADE DA LEI. AFASTAMENTO DE SUA INCIDÊNCIA PARA AS ELEIÇÕES JÁ OCORRIDAS EM 2010 E AS ANTERIORES, BEM COMO E PARA OS MANDATOS EM CURSO.

  1. A elegibilidade é a adequação do indivíduo ao regime jurídico – constitucional e legal complementar – do processo eleitoral, razão pela qual a aplicação da Lei Complementar nº 135/10 com a consideração de fatos anteriores não pode ser capitulada na retroatividade vedada pelo art. 5º, XXXV, da Constituição, mercê de incabível a invocação de direito adquirido ou de autoridade da coisa julgada (que opera sob o pálio da cláusula rebus sic standibus) anteriormente ao pleito em oposição ao diploma legal retromencionado; subjaz a mera adequação ao sistema normativo pretérito (expectativa de direito).
  2. A razoabilidade da expectativa de um indivíduo de concorrer a cargo público eletivo, à luz da exigência constitucional de moralidade para o exercício do mandato (art. 14, § 9º), resta afastada em face da condenação prolatada em segunda instância ou por um colegiado no exercício da competência de foro por prerrogativa de função, da rejeição de contas públicas, da perda de cargo público ou do impedimento do exercício de profissão por violação de dever ético-profissional.
  3. A presunção de inocência consagrada no art. 5º, LVII, da Constituição Federal deve ser reconhecida como uma regra e interpretada com o recurso da metodologia análoga a uma redução teleológica, que reaproxime o enunciado normativo da sua própria literalidade, de modo a reconduzi-la aos efeitos próprios da condenação criminal (que podem incluir a perda ou a suspensão de direitos políticos, mas não a inelegibilidade), sob pena de frustrar o propósito moralizante do art. 14, § 9º, da Constituição Federal.
  4. Não é violado pela Lei Complementar nº 135/10 não viola o princípio constitucional da vedação de retrocesso, posto não vislumbrado o pressuposto de sua aplicabilidade concernente na existência de consenso básico, que tenha inserido na consciência jurídica geral a extensão da presunção de inocência para o âmbito eleitoral.
  5. O direito político passivo (ius honorum) é possível de ser restringido pela lei, nas hipóteses que, in casu, não podem ser consideradas arbitrárias, porquanto se adequam à exigência constitucional da razoabilidade, revelando elevadíssima carga de reprovabilidade social, sob os enfoques da violação à moralidade ou denotativos de improbidade, de abuso de poder econômico ou de poder político.
  6. O princípio da proporcionalidade resta prestigiado pela Lei Complementar nº 135/10, na medida em que: (i) atende aos fins moralizadores a que se destina; (ii) estabelece requisitos qualificados de inelegibilidade e (iii) impõe sacrifício à liberdade individual de candidatar-se a cargo público eletivo que não supera os benefícios socialmente desejados em termos de moralidade e probidade para o exercício de referido munus publico.
  7. O exercício do ius honorum (direito de concorrer a cargos eletivos), em um juízo de ponderação no caso das inelegibilidades previstas na Lei Complementar nº 135/10, opõe-se à própria democracia, que pressupõe a fidelidade política da atuação dos representantes populares.
  8. A Lei Complementar nº 135/10 também não fere o núcleo essencial dos direitos políticos, na medida em que estabelece restrições temporárias aos direitos políticos passivos, sem prejuízo das situações políticas ativas.
  9. O cognominado desacordo moral razoável impõe o prestígio da manifestação legítima do legislador democraticamente eleito acerca do conceito jurídico indeterminado de vida pregressa, constante do art. 14, § 9.º, da Constituição Federal.
  10. O abuso de direito à renúncia é gerador de inelegibilidade dos detentores de mandato eletivo que renunciarem aos seus cargos, posto hipótese em perfeita compatibilidade com a repressão, constante do ordenamento jurídico brasileiro (v.g., o art. 53, § 6º, da Constituição Federal e o art. 187 do Código Civil), ao exercício de direito em manifesta transposição dos limites da boa-fé.
  11. A inelegibilidade tem as suas causas previstas nos §§ 4º a 9º do art. 14 da Carta Magna de 1988, que se traduzem em condições objetivas cuja verificação impede o indivíduo de concorrer a cargos eletivos ou, acaso eleito, de os exercer, e não se confunde com a suspensão ou perda dos direitos políticos, cujas hipóteses são previstas no art. 15 da Constituição da República, e que importa restrição não apenas ao direito de concorrer a cargos eletivos (ius honorum), mas também ao direito de voto (ius sufragii). Por essa razão, não há inconstitucionalidade na cumulação entre a inelegibilidade e a suspensão de direitos políticos.
  12. A extensão da inelegibilidade por oito anos após o cumprimento da pena, admissível à luz da disciplina legal anterior, viola a proporcionalidade numa sistemática em que a interdição política se põe já antes do trânsito em julgado, cumprindo, mediante interpretação conforme a Constituição, deduzir do prazo posterior ao cumprimento da pena o período de inelegibilidade decorrido entre a condenação e o trânsito em julgado.
  13. Ação direta de inconstitucionalidade cujo pedido se julga improcedente. Ações declaratórias de constitucionalidade cujos pedidos se julgam procedentes, mediante a declaração de constitucionalidade das hipóteses de inelegibilidade instituídas pelas alíneas “c” , “d” , “f” , “g” , “h” , “j” , “m” , “n” , “o” , “p” e “q” do art. 1º, inciso I, da Lei Complementar nº 64/90, introduzidas pela Lei Complementar nº 135/10, vencido o Relator em parte mínima, naquilo em que, em interpretação conforme a Constituição, admitia a subtração, do prazo de 8 (oito) anos de inelegibilidade posteriores ao cumprimento da pena, do prazo de inelegibilidade decorrido entre a condenação e o seu trânsito em julgado.
  14. Inaplicabilidade das hipóteses de inelegibilidade às eleições de 2010 e anteriores, bem como para os mandatos em curso, à luz do disposto no art. 16 da Constituição. Precedente: RE 633.703, Rel. Min. Gilmar Mendes (repercussão geral).”

(ADC 30, Relator(a):  Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 16/02/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-127 DIVULG 28-06-2012 PUBLIC 29-06-2012)

O julgado é esclarecedor, corrobora as conclusões até então já trazidas, e prestigia, pois, a vontade popular, e, de resto, a preciosa ressalva daquele doutrinador alhures referido, acerca da função da norma jurídica e da interpretação que se há de dedicar às condenações judiciais anteriores, se cotejadas à luz das vindouras eleições.

Nada obstante, para que este magistrado se mantenha fiel ao bom debate – e não é mesmo do seu alvitre, ao julgar, simplesmente citar julgados, ainda que da lavra da instância máxima, mencionando-os genericamente como se o seu teor já fizesse as vezes de fundamentação do caso dos autos -, doravante ainda pondero que não haveria mesmo sentido lógico e jurídico – e aqui privilegio interpretação sistemática do texto constitucional – a que a Lei Complementar estabelecesse novas hipóteses e prazos de inelegibilidade e não transcendesse seus efeitos a atos/fatos pretéritos à sua publicação (junho de 2010), visto que é a própria Magna Carta que, especificamente quanto à matéria, assegura-lhe efeitos retroativos, determinando seja observada a vida pregressa do candidato. O Direito é regramento da conduta, seja ela passada, contemporânea ou futura, consoante os valores e parâmetros ditados pela Constituição Federal. No caso da matéria dos autos, optou por regrar condutas passadas (prévio ato de improbidade administrativa e previa condenação), trazendo-lhes expressas consequências futuras – vida pregressa e seu sancionamento atual, quanto a afastar a candidatura presente, e possível mandato futuro.

Incabível, pois, a simplória alegação de que a lei não deve retroagir para alcançar fatos passados e causar surpresa ao interessado, em face da segurança jurídica e de um suposto direito adquirido do candidato detentor da “ficha” , tanto mais por não se tratar de condenação criminal, mas de disciplina legal especifica de natureza e sede eleitorais.

06 – Volvendo à hipótese dos autos, dele se observa que o interessado Kleber Calisto ostenta condenação pretérita colegiada por improbidade administrativa, sendo, portanto, inelegível até que se ultime o prazo legal de 8 (oito) anos do art. 1º I, “l” , da LC 64/90, que, ao melhor das hipóteses, teve inicio 5 (cinco) anos depois da data de 22/04/2010, data do primeiro julgamento colegiado que manteve a sanção de suspensão dos direitos políticos por 5 (cinco) anos – dies a quo, pois, em 22/04/2015, e dies ad quem 22/04/2023.

Aliás, no caso dos autos, ainda que se considerasse que o termo inicial do prazo do inc. “l”  do art. 1º da LC 64/90 fosse já o de 22/04/2010 (para tanto ignorando-se o prévio prazo da suspensão dos direitos políticos decretada pelo julgado) persistiria inelegível o candidato, pois que somente em 22/04/2018 expirar-se-ia o prazo legal de 8 (oito) anos.

Há legítima exceção constitucional. E sequer se está diante de direito adquirido, mas apenas de uma expectativa anterior, que, afinal, não se materializou (julgado citado). Não bastasse, sequer se trata de sanção de natureza criminal (punir crimes passados de forma mais severa – inelegibilidade não é pena criminal), mas mera consequência desfavorável ao pretenso candidato, oriunda da legislação eleitoral e de circunstâncias fáticas específicas.

Diante daquilo o que já se ponderou, também exsurge extreme de dúvidas o fato de que, em exercício de ponderação de interesses, à luz do principio da proporcionalidade – sempre recomendada pela doutrina constitucionalista e pelo STF, ao deparar-se com dois valores ou princípios constitucionais em aparente tensão no caso concreto -, identificada que restasse, na hipótese em apreço, tensão entre o principio da irretroatividade da lei mais severa e os princípios da legalidade, moralidade e probidade administrativa, no exercício do mandato, considerando a vida pregressa do candidato (art. 14, par. 9º), o constituinte teria mesmo privilegiado os últimos, ainda que em detrimento ao primeiro tivesse de ser – diga-se tivesse porque, como já pontuado, sequer se pode falar em direito adquirido ou situação jurídica violados, mas mera expectativa de direito, não confirmada ao final.

  1. Resta perquirir se o julgado ora noticiado importa nas demais premissas aventadas no inciso “l” do art. 1º da CL 64/90, redação da LC 135/2010, e a conclusão é desenganadamente afirmativa, já que, do teor da sentença do 1º grau, confirmada pelo colegiado em autos de ACP por Improbidade Administrativa n. 013.2006.002570-3, se lê condenação do réu por ato causador de prejuízo ao erário e de seu próprio enriquecimento ilícito (art. 10 I, lei 8.429/92, v.g. fundamentação e comando de fls. 67, 75/76), o que lhe acarreta inelegibilidade legal durante os próximos 8 (oito) anos transcorrido após expirado o prazo de suspensão dos direitos políticos fixado naquela sentença e acórdão condenatórios – e assim igualmente, ainda que se considere o dies a quo do segundo como sendo a data da primeira decisão colegiada -, mediante incidência da então novel LC 135/2010.

Não restam mesmo dúvidas de que a sentença e acórdão afirmaram claramente o ato de improbidade decorrente de ter percebido vencimentos sem a devida contraprestação, mediante assinaturas ideologicamente falsas, assim proporcionando enriquecimento indevido e dano ao erário. E a nova regra retroage para alcançar aquela condenação expressa na sentença e acórdão, em desfavor do impugnado Kleber Calisto.

Em seguida, houve recursos rejeitados, e, consoante documentos colacionados, ainda que ora careça, o decisório, de trânsito em julgado, persiste a hipótese de incidência, diante da higidez da decisão condenatória colegiada, nos termos do art. 1º, I “l”  da LC 64/90, e da improcedência da cautelar que lhe pretendia afastar os efeitos imediatos da inelegibilidade.

A CONCLUSÃO DO SILOGISMO

08 – Quanto à subsunção do fato mencionado à regra de direito – assim completando-se o silogismo que deve encerrar a sentença -, pondero, uma vez mais, que o ordenamento jurídico pátrio comina àquele expressa sanção eleitoral: a inelegibilidade, independentemente da suspensão dos direitos políticos decretada na sentença ou acórdão; trata-se de norma cogente, efeito legal, automático e lógico da anterior condenação judicial, colegiada ou definitiva seja, como, de resto, pontuou o STF, no julgado mencionado.

Por fim, e para que não reste resquício de dúvidas acerca do fato, mister relembrar a ressalva trazida pelo Min. César Peluso, ao proferir voto no julgamento citado: o momento de aferir a elegibilidade de um candidato é o momento do pedido de registro de candidatura, razão pela qual, agora, proclamo: o impugnado KLEBER CALISTO DE SOUZA suporta causa legal atual de inelegibilidade, a inviabilizar-lhe a candidatura pretendida.

09 – Não restaram satisfeitas todas as condições legais para o registro pleiteado, já que, nos termos dos documentos e julgamentos mencionados, encontra-se o interessado ainda inelegível pelo prazo legal de 8 (oito) anos. Julgo, assim sendo, procedentes as impugnações, e INDEFIRO o pedido de registro de candidatura de KLEBER CALISTO DE SOUZA ao cargo de Prefeito de Cerejeiras – eleições municipais de 2016.

Determino, de resto, anote-se o respectivo impedimento no sistema, através do correspondente ASE, se pendente ainda restar.

Anote-se. Registre-se. Publique-se. Intime-se.

Cerejeiras, 29 de agosto de 2016.

 

BRUNO MAGALHÃES RIBEIRO DOS SANTOS

Juiz Eleitoral

 

 

Texto: Extra de Rondônia

Foto: Divulgação

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