Prefeita Glaucione Rodrigues comentou fato inédito / Foto: Divulgação

A Juíza Eleitoral Emy Karla Yamamoto Roque, da comarca de Cacoal, resolveu um impasse jurídico envolvendo a candidatura da prefeita Glaucione Rodrigues (MDB), que formalizou pedido de renúncia às eleições, mas dias depois voltou atrás e requereu a continuidade do seu nome na disputa eleitoral (leia mais AQUI).

Contudo, neste sábado, 17, a magistrada resolveu o imbróglio e homologou a renúncia de Glaucione. Minutos após a sentença, o site da Justiça Eleitoral considerou a mandatária municipal inapta no pleito.

Na sentença obtida pelo Extra de Rondônia, a magistrada afirmou que consta no documento apresentado por Glaucione, expressamente, a “renúncia em caráter irrevogável” para “não causar prejuízos aos andamentos de atos administrativos eleitorais do partido e da coligação”.

Argumentou que a Resolução 23609/19-TSE é clara ao elencar os requisitos para a renúncia em seu artigo 69 e não há nele ou em qualquer outro dispositivo da Resolução ou norma eleitoral referência à necessidade de deliberação pelo Partido ou Coligação acerca da renúncia.

“A natureza da renúncia, como ato unilateral e potestativo a ser exercido única e exclusivamente pelo candidato, opera seus efeitos imediatamente e, portanto, descabida a retratação”, destacou a magistrada.

Glaucione é considerada inapta pela Justiça Eleitoral / Foto: Extra de Rondônia

>>> LEIA, ABAIXO, A SETENÇA NA ÍNTEGRA:

 

SENTENÇA

 

Trata-se de Requerimento de Registro de Candidatura deferido em 08 de outubro.

Em 15 de outubro, a Requerente afirma que  “circula nas redes sociais a notícia de que esta Requerente, candidata ao cargo de prefeito com registro deferido por esse Douto Juízo Eleitoral, teria renunciado à sua candidatura nas presentes eleições municipais de 2020.

Ocorre que a Requerente expressamente manifesta o seu desejo de continuar candidata, conforme declaração anexa, refutando qualquer documento que possa ter assinado há mais de cinco dias, porém que não representa a sua verdadeira vontade livre, consciente e desimpedida”.

Aduz que “qualquer documento assinado pela candidata Glaucione a mais de 05 dias, não homologado pela executiva de seu partido o MDB não expressa sua vontade livre e desimpedida”. Alega que “caso seja apresentado qualquer declaração em sentido contrário, inclusive que não tenha sido apresentado e homologado pela executiva de seu Partido MDB, que é o Órgão Partidário deliberativo designado pela assembleia da convenção partidária realizada dia 13 de setembro e juntada neste processo, com competência para estes atos e que em primeiro lugar deve deliberar interna corporis, para depois ir a deliberação da coligação, devendo neste sentido, dito documento da suposta renúncia, ser negado sua eficácia, por não representar a verdadeira vontade da candidata, e não haver respeitado o devido encaminhamento de análise do MDB”. Junta declaração com reconhecimento de firma datado de 15/10/2020.

No DRAP n.0600142-03.2020 foi juntada renúncia expressa da candidata, datada de 09/10/2020, com reconhecimento de firma em 13/10/2020. (ID 16911568)

É o relato. DECIDO.

 

Da Renúncia à Candidatura

A Resolução 23609/19-TSE determina em seu artigo 69 e §1º:

Art. 69. O ato de renúncia do candidato será expresso em documento datado, com firma reconhecida por tabelião ou assinado na presença de servidor da Justiça Eleitoral, que certificará o fato.

  • 1º O pedido de renúncia será apresentado sempre ao juízo originário e juntado aos autos do pedido de registro do respectivo candidato, para homologação e atualização da situação do candidato no Sistema de Candidaturas.

O pedido de renúncia foi apresentado a este Juízo nos autos 0600142-03.2020 – DRAP correlato da Coligação “Cacoal Seguindo em Frente”, por meio da qual a requerente postulou o registro de sua candidatura ao cargo de Prefeito.

Nos termos do §1º do artigo supratranscrito, DETERMINO A JUNTADA da renúncia nestes autos de Requerimento de Registro de Candidatura.

Passo à análise da petição de ID Num. 16529425.

 

Da Validade da Renúncia

A requerente peticiona “refutando qualquer documento que possa ter assinado há mais de cinco dias, porém que não representa a sua verdadeira vontade livre, consciente e desimpedida”.

Não esclarece o motivo pelo qual a renúncia não representa sua vontade livre, consciente e desimpedida, deixando de narrar quais seriam os possíveis vícios a macular sua declaração de vontade.

A renúncia é datada de 09/10/2020 com reconhecimento de firma em 13/10/2020. Neste documento a renunciante expressamente declara os motivos da renúncia:

“considerando meu afastamento da cidade de Cacoal por meio de decisão do Poder Judiciário, considerando o pleito eleitoral em andamento, para não causar prejuízo aos andamentos de atos administrativos eleitorais do partido e da coligação”

Além disso, consta expressamente a “renúncia em caráter irrevogável”

O “afastamento da cidade de Cacoal por meio de decisão do Poder Judiciário” refere-se, como é de conhecimento público e notório, aos autos 0002211-25.2020.8.22.000, em que fora decretada a prisão preventiva e o determinada cautelarmente a suspensão do exercício da função pública da Requerente.

Coerente, assim, os motivos expressos na renúncia à moldura fática vivenciada pela renunciante. Tais elementos denotam que não há vício de consentimento na sua renúncia como declaração unilateral de vontade.

A requerente assevera que a renúncia deve ter sua eficácia negada por não haver respeitado o encaminhamento para análise do MDB, para deliberação interna corporis para, somente então, “ir para deliberação da coligação”.

Este argumento não pode ser acolhido uma vez que a Resolução 23609/19-TSE é clara ao elencar os requisitos para a renúncia em seu artigo 69 e não há nele ou em qualquer outro dispositivo da Resolução ou norma eleitoral referência à necessidade de deliberação pelo Partido ou Coligação acerca da renúncia.

Válida, perfeita e eficaz  a renúncia, passo à análise da “declaração expressa de vontade de manutenção de candidatura” (ID Num. 16529426).

 

Do Descabimento da Retratação da Renúncia

A renúncia é datada de 09/10/2020 com reconhecimento de firma em 13/10/2020.

Já a declaração de manutenção de candidatura é datada de 15/10/2020 com reconhecimento de firma na mesma data.

A natureza desse declaração seria de retratação da renúncia, uma vez posterior.

Tanto é assim que, em dita declaração a requerente faz menção à renúncia quando assenta “refutando totalmente qualquer documento contrário”.

A retratação da renúncia não é aceita pelos Tribunais Eleitorais, seja anterior, seja posteriormente à homologação judicial.

A natureza da renúncia, como ato unilateral e potestativo  a ser exercido única e exclusivamente pelo candidato, opera seus efeitos imediatamente e, portanto, descabida a retratação.

Não há previsão para a retratação da renúncia seja na Lei 9504/97, seja nas Resoluções do TSE, editadas a cada eleição, justamente porque contrária à celeridade dos procedimentos e processos eleitorais cujos prazos são exíguos, contínuos e peremptórios.

Assim é que, em casos semelhantes, sistematicamente os Tribunais Eleitorais preceituam ser descabida a retratação da renúncia, como se vê dos julgados do TSE e de diversos TREs:

RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. PEDIDO. SUBSTITUIÇÃO. CANDIDATO. PREFEITO. VICE-PREFEITO. ANTERIORIDADE. RENÚNCIA. DECISÃO. MAIORIA ABSOLUTA. ÓRGÃOS DE DIREÇÃO. PARTIDOS POLÍTICOS COLIGADOS. LEI Nº 9.504/97, ART. 13, §§ 1º E 2º.VIOLAÇÃO.INOCORRÊNCIA.(…)2. A renúncia à candidatura consubstancia ato unilateral, submetendo-se à homologação apenas para verificação de sua validade, não havendo, portanto, apreciação quanto ao seu conteúdo. Precedentes.3. Inviável, em sede de recurso especial, alterar o entendimento do acórdão regional, que, após detalhada análise probatória, concluiu pelo cumprimento da exigência prevista no art. 64, § 3º, da Res.-TSE nº 22.718/2008, no sentido de que a decisão de substituição fora tomada pela maioria absoluta dos órgãos executivos de direção dos partidos coligados (Súmulas nos 7/STJ e 279/STF).4. Recurso especial desprovido.(TSE – REspe: 36150 BA, Relator: Min. MARCELO HENRIQUES RIBEIRO DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 18/03/2010, Data de Publicação: DJE – Diário da Justiça Eletrônico, Data 10/05/2010, Página 19)

 

NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. RENÚNCIA À CANDIDATURA. ATO UNILATERAL. HOMOLOGAÇÃO JUDICIAL. REQUISITO DE VALIDADE. PEDIDO DE SUBSTITUIÇÃO DE CANDIDATO ANTERIOR À PUBLICAÇÃO DA SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA. VIOLAÇÃO AOART. 64, § 1º, DA RESOLUÇÃO 22.717/2008. INOCORRÊNCIA.(…) II – A renúncia à candidatura é ato unilateral, submetido, apenas para efeitos de validade do ato, à homologação da justiça eleitoral. III – A finalidade do § 1º do art. 64 da Resolução 22.717/2008 é dirimir eventuais dúvidas sobre o início do prazo para o exercício do direito à substituição de candidato e não penalizar o partido que se adianta no pedido ou,ainda, obrigá-lo a aguardar a homologação da renúncia para que efetue o requerimento de substituição.IV – Recurso especial eleitoral conhecido e improvido. (TSE – REspe: 35584 PA, Relator: Min. ENRIQUE RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 30/06/2009, Data de Publicação: DJE – Diário da Justiça Eletrônico, Tomo 165, Data 31/08/2009, Página 39) (o original não ostenta grifos)

 

AGRAVO REGIMENTAL. ELEIÇÕES 2014. CARGO DE DEPUTADO ESTADUAL. RENÚNCIA. PEDIDO DE RETRATAÇÃO. INADMISSIBILIDADE. FORMALIDADES LEGAIS CUMPRIDAS. ART. 61, § 8º, DA RESOLUÇÃO-TSE Nº 23.405/2014. AUSÊNCIA DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO. HOMOLOGAÇÃO DA RENÚNCIA. PROVIMENTO DOS AGRAVOS. 1. A renúncia é um direito potestativo exercido exclusivamente pelo candidato, mediante manifestação unilateral de vontade, submetido apenas para efeitos de validade do ato, à homologação da Justiça Eleitoral. 2. A homologação judicial é mero exaurimento da renúncia à candidatura, a qual, preenchidos os requisitos, opera seus efeitos imediatamente. Precedentes do TSE. 3. A renúncia tem aptidão plena para produzir seu efeito extintivo da candidatura com força imediata, independente de atos do Órgão Jurisdicional ou de terceiros. Assim sendo, resta incabível a retratação da declaração de vontade, mesmo antes da homologação, posto que já configurado como ato jurídico perfeito, em homenagem à funcionalidade e celeridade do processo eleitoral e por ausência de previsão legal para pedido de desconsideração de renúncia. 4. Dessa forma, observadas as formalidades legais do art. 61, § 8º, da Resolução nº 23.405/2014 e não se comprovando vício de consentimento, cumpre a esta Corte Regional realizar a homologação do pedido de renúncia ao registro de candidatura, apesar da protocolização de retratação que não possui guarida no ordenamento jurídico. 5. Provimento dos agravos regimentais. Prejudicadas as ações de impugnação. (TRE-SE – AgR: 61245 SE, Relator: RICARDO MÚCIO SANTANA DE ABREU LIMA, Data de Julgamento: 02/09/2014, Data de Publicação: PSESS – Sessão Plenária, Volume 16:24, Data 02/09/2014) (o original não ostenta grifos)

Recurso Eleitoral. Registro de Candidatura. Eleições 2008. Deferimento do registro. Apresentação de termo de renúncia. Homologação.Pedido de reconsideração da renúncia e restabelecimento da candidatura. Cabimento de retratação somente se comprovado vício grave de vontade, o que não é o caso dos autos.Recurso a que se nega provimento. (TRE-MG – RE: 3816 MG, Relator: ANTÔNIO ROMANELLI, Data de Julgamento: 01/09/2008, Data de Publicação: PSESS – Publicado em Sessão, Data 01/09/2008)

 

Da Inexistência de Dilação Probatória

Por fim,  a requerente “requer poder se manifestar sobre eventual propositura contrária à continuidade de sua candidatura, podendo exercer efetivamente o seu direito à ampla defesa e ao contraditório, para tanto apresentando a defesa e produzindo as provas que se fizerem cabíveis”.

O Requerimento de Registro de Candidatura é procedimento cujas fases são definidas e estabelecidas em lei e na Resolução 23609/2019-TSE, não havendo previsão de defesa e produção de provas em caso de renúncia.

A requerente, quando do peticionamento no ID Num. 16529425, já tinha ciência do teor da renúncia por ela formulada mas limitou-se a pugnar por prazo para defesa e produção de provas de forma genérica e abstrata, sem indicar em que consistiria o suposto vício de consentimento ou vontade e sem apontar provas que pretendia ver produzidas.

Estamos há exatos 30 dias do pleito eleitoral e, com a renúncia, necessário o trâmite de requerimento de registro de candidato em substituição.

Assim, preenchidos os requisitos formais da renúncia, desnecessária e incabível a abertura de instrução probatória nestes autos.

 

Do Dispositivo

POSTO ISSO, nos termos do 69 e §1º da Resolução TSE nº 23.609/2019, HOMOLOGO A RENÚNCIA à candidatura de GLAUCIONE MARIA RODRIGUES NERI ao cargo de Prefeita do Município de Cacoal.

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

  1. Junte-se via desta no DRAP 0600142-03.2020.
  2. I. o MP para ciência e a Coligação para fins do disciplinado no artigo 72 da citada Resolução.
  3. Em eventual recurso, proceda-se nos termos do artigo 59 e seu par. único, da mesma Resolução.
  4. Após, arquivem-se.

 

Cacoal, 17 de Outubro de 2020.

 

EMY KARLA YAMAMOTO ROQUE

Juíza Eleitoral

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