O cenário em 2020 foi otimista. O ano teve menor oferta de animais com foco na cria e exportações em alta. Cerca de 50% da proteína bovina seguiu para a China que viveu os reflexos da Peste Suína Africana (PSA) e teve seus plantéis afetados. Quando somadas as outras proteínas (aves e suínos) o país mais Hong Kong levam cerca de 63% do total.
Segundo dados da Scot Consultoria, apresentados no encontro de analistas, realizado nesta sexta-feira (27), no primeiro semestre houve queda de 8,1% em abates de bovinos, foram 18% a menos em vacas e em novilhas queda de 12%. “Isso ocorreu mesmo em um ano em que a China demandou muito e eles exigem animais jovens, até 30 meses”, destacou o analista Hyberville Neto. E o chamado boi China (animais de até 4 dentes) tem algumas vantagens como um preço médio superior de até R$ 15/@.
As exportações de carne bovina tiveram alta crescente no ano, chegando a acumular elevação de 33,2% em junho. No ano, até outubro, a alta é de 11,8%. Com isso a variação de preço em 12 meses (novembro 2019 a novembro de 2020) foi de variação superior de 42,7% no boi gordo; 73,2% no boi magro; 78,9% no garrote; 64,9% no bezerro e 68,6% na desmama.
COMO SERÁ 2021?
Para o time de especialistas o pecuarista pode esperar um 2021 mais positivo do que foi este ano. 2020 foi atípico a começar pela pandemia que impactou diretamente os frigoríficos. Muitos chegaram a fechar temporariamente mas com rígidos protocolos sanitários conseguiram retomar as atividades. Segundo o Ministério da Agricultura não foi registrada nenhuma baixa em estabelecimentos sob selo SIF em outubro.
Para Luciano Pascon, da indústria frigorífica Frigol, o desafio para o ano que vem é dar continuidade ao cenário de alta. “O boi voltou a se tornar reserva de valor. Nos tempos de estabilidade ele perdeu esse valor e como tivemos um ano de economia incerta o investimento passou a se voltar para o boi, mas vejo a necessidade de profissionalizar mais a atividade”, destaca.
Hyberville Neto aposta que o produtor pode esperar preços até maiores do que os praticados nesta temporada. “Os preços vão seguir sustentados, talvez não os R$ 300 (a arroba) que todos querem mas maiores que ano passado e começo deste certamente. O agro vai bem e a gente entende que a demanda por bovinos vai seguir forte”, comenta.
Para os analistas a China, de certa forma, mudou o perfil, antecipando a saída dos animais, com ciclos mais rápidos. E deve seguir demandando. Atualmente outros 29 frigoríficos bovinos aguardam a habilitação do governo chinês. Leandro Bovo, da Radar Investimentos, acredita que depois da pandemia alguns países que deixar de demandar devem voltar às compras, associado às projeções do USDA de que a China vai aumentar em 8% sua demanda por proteína. Também acredita em uma melhora do mercado interno. “Ano que vem a expectativa é aumento sutil da oferta de gado, mas não será suficiente para afrouxar o mercado. Deve vir uma melhora de consumo que vai absorver os níveis atuais”, diz.
DESAFIOS E DEFESA SANITÁRIA
A boa safra de soja e milho repercutiu nos preços dos insumos, que pegaram os criadores de calças curtas. Farelo de soja e milho seguem com ampla valorização. Segundo dados das cotações do Portal Agrolink nesta sexta-feira (27) a saca de 60kg está acima dos R$ 80 no mercado de Campinas (SP) a tonelada de farelo de soja está R$ 2.690,00, no Rio Grande do Sul. Também se valorizaram os preços dos fertilizantes, como a uréia agrícola. Em São Paulo a tonelada sai em média R$2.017, sem frete, com valorização de 26% no mês em relação a novembro do ano passado.
Com a estiagem em estados do Sul a primeira safra de milho deve ter perdas significativas e as apostas ficam para a safrinha. Com janela apertada muitos produtores podem migrar para o sorgo, causando menos oferta do grão no mercado.
Para o analista Rafael Ribeiro o produtor deve trabalhar os custos de produção para 2021 estrategicamente porque os insumos tendem a continuar em alta. “Com a estiagem há maior pressão de alta até a chegada da colheita do milho segunda safra. Não acredito em queda de preço. É um ano de preocupação”, define.
Outra questão observada pelos debatedores é a retirada da vacinação da febre aftosa no Brasil até maio de 2021. Para Francisco Turra, que conduziu por anos a Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), a questão da sanidade é um diferencial do Brasil que não é assolado nem pela Peste Suína (atualmente na Ásia, África e Europa) e pela Influenza Aviária (com surto forte na União Europeia). “Nossos planteis são saudáveis e isso é apetitoso para o mundo”, reforça. Turra acredita que a vacinação é uma garantia de rastreabilidade e sanidade mas muitos mercados não aceitam proteína advinda de países que ainda vacinam.
Para Marcio Rezende Evaristo Carlos, que foi adido agrícola na União Europeia, região que tem muitas exigências para importar, este foi o ano de observar e resguardar a defesa agropecuária, afinal a Covid-19 teria vindo de um caso ligado a sanidade animal. Para ele é fundamental que o Brasil dê certezas para os importadores e possa acessar mercados que exigem que seja livre de vacina contra aftosa, como o Japão. Por outro lado, reforça que o país não pode deixar a defesa de lado e ter planos de contingência caso surja um caso da doença.
“Discutimos desde o inicio que vai ser retirada a vacina. O tempo disso que preocupa e como está a defesa agropecuária. Porque se você não tem mais problema aí este é o problema. Há menos investimento em estrutura e pessoal e se acontece um problema tudo vai abaixo. O produtor tem que cobrar do governo esta organização”, defende.