A Embrapa lançou um aplicativo para smartphone (para os sistemas iOS e Android) e uma plataforma web de acesso gratuito com informações sobre soluções tecnológicas sustentáveis da Empresa para aplicação no bioma Amazônia.
Desenvolvidas pela Embrapa Territorial (SP) no âmbito do Fundo Amazônia, as ferramentas permitem fazer buscas por município ou conjunto de municípios e visualizar espacialmente as tecnologias, em um mapa interativo.
No caso do aplicativo, batizado como Tec Amazônia, é possível utilizar o GPS do celular para identificar a localização do usuário e exibir os produtos, processos e serviços disponíveis para a região onde ele está. A tecnologia funciona inclusive off-line, para facilitar o acesso de produtores e extensionistas agropecuários.
De açaí a tambaqui, as ferramentas mostram, atualmente, 131 soluções tecnológicas para 50 produtos agropecuários presentes no bioma. A analista Daniela Maciel, da Embrapa Territorial, conta que, para chegar a essa lista, foram levantados os produtos presentes de forma recorrente em cada um dos municípios da Amazônia, de 2014 a 2018, nos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Maciel explica que há restrições territoriais para a aplicação de tecnologias, por isso foi preciso, primeiramente, visualizar a ocorrência das atividades agropecuárias para, só então, associar produtos, processos e serviços desenvolvidos pelas nove Unidades da Embrapa presentes no bioma. “Precisamos entender onde está a prática para depois associá-la à tecnologia”, resume. Outras soluções tecnológicas para o bioma já estão sendo mapeadas pela equipe e devem ser integradas às ferramentas até o fim do ano.
TECNOLOGIA
Para cada uma das soluções, as ferramentas exibem uma descrição, informações de onde encontrar e links para download de materiais. “Com essas ferramentas, buscamos facilitar o processo de identificação e aplicação das tecnologias pelo produtor rural, pelo extensionista, pelos agentes públicos, por todos os interessados em saber de que soluções a Empresa dispõe para adoção no bioma Amazônia”, afirma Maciel.
Na plataforma web, a página inicial da pesquisa por municípios ilustra, em uma espécie de “colcha de retalhos”, os produtos para os quais há maior número de soluções tecnológicas disponíveis. Os bovinos são campeões, seguidos de café canéfora e peixes, mandioca e madeira. Outros itens da mesa de todos os brasileiros também ganham destaque: arroz, feijão, banana, milho e leite. E os produtos regionais não ficam de fora: castanha-do-pará, açaí, tambaqui e copaíba.
De acordo com o Balanço Social 2020 da Embrapa, as tecnologias desenvolvidas pelos centros de pesquisa localizados na Amazônia estão em 9,47 milhões de hectares na região. Para a analista da Embrapa Territorial, “a tecnologia é o único meio capaz, atualmente, de gerar renda, melhorar a produtividade e preservar o bioma Amazônia”.
Maciel diz que as ferramentas também podem apoiar a gestão da carteira de projetos de pesquisa e de transferência de tecnologias da Embrapa e seus parceiros. “Por meio dessas ferramentas, somos capazes de observar quais produtos dispõem de mais soluções e aqueles que ainda carecem de desenvolvimento tecnológico”, detalha.
A pesquisadora Michelliny Bentes, da Embrapa Amazônia Oriental (PA), compartilha da opinião de que a visualização territorial das cadeias produtivas e das tecnologias existentes contribuem para a gestão de projetos e diz que, se existissem antes, as ferramentas teriam facilitado o próprio planejamento do Projeto Integrado da Amazônia – PIAmz (veja quadro abaixo). “É uma plataforma que agrega informações e tenho certeza de que será muito útil para os técnicos, pesquisadores, gestores e parceiros institucionais”, avalia.
APOIO
A expectativa é que as ferramentas sejam utilizadas não só por produtores rurais, mas também por equipes da extensão agropecuária. Antes do lançamento, elas foram testadas por 15 extensionistas dos estados do Acre, Pará e Rondônia. Um deles foi o biólogo Reginaldo da Silva, da Emater-RO. Ele conta que a busca de informações sobre tecnologias é constante para quem atua na extensão, de forma a conseguir atender à diversidade de produtos na agropecuária da região.
“Não conseguimos nos especializar em uma única atividade, então, precisamos estar sempre pesquisando para sermos capazes de oferecer a assistência técnica adequada para todas as culturas”, detalha. Silva avalia que as ferramentas vão facilitar essas pesquisas e que os produtores rurais de sua região também terão interesse em utilizá-las diretamente. O extensionista entende que a ideia é inovadora e destaca, como ponto forte, a possibilidade de uso off-line. “O programa é bem intuitivo, achei fácil encontrar as informações”, complementa o técnico agrícola Antonio Santiago, que atua na extensão rural no Acre.
Para a engenheira agrônoma Liliam Soares, extensionista da Secretaria de Agricultura do município de Bom Jesus do Tocantins, na região sudeste do Pará, o aplicativo permite ao técnico ter acesso a uma base de conhecimento e informação que otimiza o tempo de quem está no campo diariamente. “A atualização profissional constante dos técnicos da extensão não é fácil, então essa ferramenta, além de possibilitar mais agilidade no trabalho, preenche a lacuna da falta de acesso à informação e capacitação do técnico”, comenta.
Ela, que trabalha com cerca de 250 a 300 famílias de Bom Jesus do Tocantins, afirma que a produção familiar do município passa por um momento de transição da pecuária para a agricultura, e a tecnologia nesse processo é importante para recuperar áreas degradadas, produzir com mais sustentabilidade e fugir da agricultura tradicional de corte e queima. “O fogo e a pastagem extensiva estão entre as principais causas da degradação ambiental da região”, acrescenta Liliam.
VITRINE
A plataforma web e o aplicativo Tec Amazônia são resultados do projeto Interação, intercâmbio e construção do conhecimento e comunicação nos projetos do Fundo Amazônia (Amazocom), um dos 19 projetos executados pela Embrapa que compõem o Projeto Integrado da Amazônia (PIAmz). O PIAmz é financiado pelo Fundo Amazônia e operacionalizado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em cooperação com o Ministério do Meio Ambiente.
A engenheira florestal e pesquisadora Michelliny Bentes, coordenadora do PIAmz, explica que o Fundo Amazônia tem como principal foco a redução do desmatamento e da degradação ambiental na região. “Para isso foi preciso adentrar na questão tecnológica e produtiva buscando alternativas e práticas que pudessem diminuir as perdas ambientais, o desmatamento, aumentar a produtividade, diversificar a produção e reduzir o uso do fogo no preparo de áreas”, conta a pesquisadora.
O PIAmz atua por meio de 19 projetos de transferência de tecnologias em quatro grandes eixos temáticos:monitoramento do desmatamento, da degradação florestal e dos serviços ecossistêmicos; manejo florestal e extrativismo; tecnologias sustentáveis para a Amazônia; e aquicultura e pesca.
Os públicos do projeto, explica a pesquisadora, são os extrativistas, pescadores, assentados, agricultores tradicionais e toda a rede de técnicos e multiplicadores que se relacionam com esses públicos no dia a dia. Ela ressalta que o desafio foi aliar as necessidades do projeto e da região às das comunidades locais. “Como restaurar uma área de reserva legal combinando também o desejo do produtor para acessar o mercado local e a vocação da região?”, exemplifica Michelliny. “Não se tratou simplesmente de reunir tecnologias e levar para o campo, foi um processo de diálogo, construção conjunta, um percurso”, comenta.
O jornalista e pesquisador Antônio Heberlê, coordenador do projeto Amazocom, diz que as ações de interação social e comunicação são estratégicas para o PIAmz, em função dos seus objetivos, voltados para transferência de tecnologia. “O desafio para a Embrapa foi de apresentar os resultados em dois anos e esse curto prazo impõe inserir metodologias adequadas, das áreas da sociologia e da antropologia, e foi isso que aplicamos, com boa repercussão em todos os demais projetos do PIAmz.”
Para o agrônomo e pesquisador Haron Abrahim Xaud, da Embrapa Roraima (RR), “a mudança só é possível se você consegue ter uma presença forte em um território que é continental”. O Projeto Integrado da Amazônia envolve uma equipe de 1.700 profissionais, entre empregados da Embrapa e colaboradores externos. “São mais de 600 atividades, entre capacitações, ações de campo e 150 Unidades de Referência Tecnológica em todos os estados da Amazônia Legal. A ação com o público é intensa. É uma grande vitrine da Embrapa na região”, afirma.
TRABALHO INTEGRADO
Baseado em uma plataforma semelhante construída para a região do Matopiba (área de expansão entre os estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), o trabalho foi extenso. “Demandou muitas ações de levantamento, mineração, análise, validação e visualização de dados, o que não foi simples, uma vez que, mesmo lançando mão de muitas ações automatizadas, existem outras em que precisamos da checagem manual”, detalha a analista da Embrapa Territorial Daniela Maciel.
Os 246 produtos, processos e serviços exibidos na plataforma e no aplicativo foram desenvolvidos pelos nove centros de pesquisa que a Embrapa mantém na região amazônica: Embrapa Acre (AC), Embrapa Agrossilvipastoril(MT), Embrapa Amapá (AP), Embrapa Amazônia Ocidental (MA), Embrapa Amazônia Oriental (PA), Embrapa Cocais(MA), Embrapa Pesca e Aquicultura (TO), Embrapa Rondônia (RO) e Embrapa Roraima (RR). Todas participaram do desenvolvimento das ferramentas, com suas equipes de Transferência de Tecnologias. “Existem tecnologias geradas por outras Unidades e para outros contextos que podem ser aplicadas ao território. Essas tecnologias serão objeto de estudo numa próxima oportunidade”, explica Maciel.
CARDÁPIO
Segundo o IBGE, na Amazônia estão 970 mil estabelecimentos agropecuários, e 82% deles são de produção familiar. É nesse contexto que o Fundo Amazônia, como explica o pesquisador Everaldo Nascimento, da Embrapa Amazônia Oriental, busca, com o apoio da tecnologia, recuperar áreas degradadas, diminuir passivos ambientais e melhorar a produção e a renda das famílias.
A Embrapa oferece um cardápio de tecnologias, mas é o ajuste no campo, a adaptação às condições locais, que podem garantir o sucesso da adoção, segundo o pesquisador. “Área de agricultor não é campo experimental, é produção real, tem seca, tem praga, o produtor não tem recursos para comprar o adubo. Então o papel do técnico é, junto com o produtor, ajustar esse sistema, essa tecnologia, em função do seu próprio conhecimento e da necessidade da família. O projeto acaba, mas o processo não”, acrescenta.
O aplicativo Tec Amazônia vem apoiar as ações no campo, continua Nascimento. “Por exemplo, se o técnico quiser saber sobre a BRS Pará, cultivar de açaizeiro para terra firme, ele pode saber onde está implantada, encontrar cursos de capacitação, informações tecnológicas, acessar publicações, vídeos e cartilhas no momento da ação no campo”, exemplifica. “É tudo o que se busca em uma tecnologia: é fácil, barata e pode ser acessada em poucos cliques. Isso é revolução na agricultura”, acredita.
Para Haron Xaud, da Embrapa Roraima, “as ferramentas facilitam o trabalho de ’pescaria‘ das informações”. Ele acredita que se o agricultor percebe que, além daquela cartilha, existe uma equipe por trás, um plantio na região, uma ação de capacitação e sabe que tem uma rede de pessoas envolvidas na ação, isso começa a fechar um elo de crédito na tecnologia. “O elo da publicação, o elo da equipe, o elo da presença entre os diferentes projetos. Tudo isso somado fortalece toda a rede de entrega do PIAmz”, finaliza.