A inflação brasileira caminha para encerrar o ano de 2022 abaixo dos índices dos Estados Unidos, Europa e Reino Unido.
Será a primeira vez que isso acontecerá caso as projeções do mercado financeiro se concretizem. A variação do índice oficial de preços ao consumidor deve fechar abaixo de 7% contra estimativas de 8% nos Estados Unidos, 7,5% na Zona do Euro e 13% no Reino Unido.
Depois de registrar em julho queda de 0,68%, o menor resultado da série histórica do índice, iniciada em janeiro de 1980, de acordo com dados de IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a previsão do mercado é que o índice de preços tenha novo recuo em agosto (-0,26%).
O IPCA (índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), que acumula 10,07% nos últimos 12 meses, deve voltar a ter um dígito e ficar menos distante do teto da meta estabelecida pelo governo para o período, de 3,5%, com margem de tolerância de 1,5 ponto (de 2% a 5%). No ano, o índice tem alta de 4,77%.
Pela oitava semana consecutiva, as expectativas para a inflação do Boletim Focus, do Banco Central, divulgado nesta segunda-feira (22), recuaram. As projeções mostram o IPCA de 2022 em 6,82%, ante alta prevista de 7,02%. Há quatro semanas, a estimativa era de um salto de 7,3% nos 12 meses finalizados no próximo mês de dezembro.
“Esse período de maior pressão inflacionária concentrada em alimentos parece que vai oferecer uma trégua. Não que a alimentação vá apresentar alguma queda de preços, como a gasolina apresentou. Isso está longe de acontecer. Mas uma desaceleração pode acontecer em agosto”, afirma o economista André Braz, do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas).
A inflação tem sido um problema não só para o Brasil, mas também para outros países. Após os impactos econômicos da pandemia de Covid-19, o aumento do preço de matérias-primas, principalmente do petróleo, por causa da guerra entre Rússia e Ucrânia, pressionou os preços no mundo.
Além do conflito, houve ainda os lockdowns na China, que provocaram gargalos de produção. Esses fatores, somados a questões locais, fizeram com que várias nações registrassem grande variação da inflação.
O economista do Ibre explica que o mundo está passando por pressão inflacionária maior. E o remédio para conter essa inflação é exatamente o aumento de juros, como tem sido feito no Brasil. A taxa básica de juros, a Selic, já registrou 12 altas seguidas desde março de 2021 e está em 13,75% ao ano.
Com o movimento de desaceleração sustentada por essa possibilidade de o mundo crescer menos, dada a necessidade de aumento de juros para conter a inflação, ao longo de agosto e setembro os brasileiros devem ver a alimentação ainda com inflação, mas mais baixa do que vem registrando nos últimos meses.
“Tem chance de o país fechar o ano com índice de preços menor que nos Estados Unidos, Europa e Reino Unido, porque a expectativa da gente estava em torno de 7%, agora já está próxima de 6,5% e, a depender do resultado da inflação de agosto, pode até ficar abaixo de 6%”, estima.
Mas boa parte dessa desaceleração fica muito concentrada em gasolina e energia elétrica, com a redução da alíquota do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) sobre a gasolina e a energia elétrica nos estados e a medida do governo federal que zerou o PIS/Cofins sobre a gasolina e o etanol até o fim deste ano.
Além disso, a Petrobras reduziu os preços nas refinarias por três vezes em menos de um mês, com adequação aos valores globais do petróleo. O resultado já é sentido nas bombas. O valor médio do litro já recuou 26,9% (R$ 1,99), em dois meses.
Segundo dados da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis), o preço médio do combustível chegou a R$ 5,40, na semana de 14 a 19 de agosto, o valor mais baixo desde maio de 2021.
No entanto, a desaceleração não alcança exatamente toda a população brasileira. Isso porque a gasolina é mais usada pela classe média alta. Para o economista, essa redução vai ser percebida com mais intensidade em orçamentos de famílias mais ricas.
A tendência é que esse movimento se acentue nos próximos meses. “Para este ano, a gente espera uma desaceleração mais geral dos preços, algo que não estava no radar, impulsionado pela perda de fôlego da economia mundial. Mas a maior intensidade desse movimento, infelizmente, sentido pelos mais ricos, porque é basicamente sustentada pela energia e gasolina. Os mais pobres vão pegar alguma coisa de alimentação, mas de menor intensidade”, acrescenta Braz.
A economista Claudia Moreno, do C6 Bank, explica que a inflação hoje é um fenômeno global. No Brasil, o IPCA acumula alta de 10% em 12 meses até julho deste ano. Na Zona do Euro, o índice de preços bateu recorde e subiu 8,9% no mesmo período. No Reino Unido, atingiu 10,1% e também foi a mais alta já vista. Por fim, nos EUA a inflação acumula alta de 8,5%.
“Tivemos um choque global que começou com a crise sanitária, passou por problemas na cadeia global de produção de bens, forte alta de commodities e guerra na Ucrânia. Além de todos esses choques, tivemos estímulos dados em excesso durante a pandemia em alguns países, como foi o caso dos Estados Unidos”, afirma a economista do C6 Bank.
Segundo ela, as comparações devem levar em conta as particularidades de cada país. Nos EUA, a economia forte e o mercado superaquecido mantêm a inflação alta, pelo lado da demanda. A Europa sofreu recentemente o impacto da alta dos preços de energia, que estão levando a inflação para níveis altíssimos. E essa é uma questão complicada, sofrem com preços altos por uma restrição na oferta de gás.
A taxa de inflação da Alemanha, a maior economia da zona do euro, poderá atingir pico de mais de 10% até o fim do ano, de acordo com relatório mensal do Bundesbank (Banco Central da Alemanha), publicado nesta segunda-feira (22).
A Alemanha tem sido um dos países europeus mais prejudicados pela decisão da Rússia de cortar suas exportações de gás para a região, em resposta às sanções que a União Europeia (UE) impôs a Moscou pela guerra na Ucrânia.
No Reino Unido, que também sofre com aumento da energia após a invasão russa da Ucrânia, o índice de preços saltou para 10,1% em julho, o mais elevado em 40 anos, de acordo com o ONS (Escritório Nacional de Estatísticas). Em junho, a inflação em ritmo anual foi de 9,4%.
A inflação ao consumidor nos Estados Unidos acelerou com elevação dos preços da gasolina e dos alimentos, resultando em junho em 9,1%, a maior taxa anual em 40 anos e meio. As expectativas são de que o Federal Reserve, banco central local, aumente os juros em 0,75 ponto percentual em setembro.