No primeiro ano de atividades suas equipes atenderam 31.533 pacientes. Alguns deles viajavam para outros estados. Na pandemia, quando muitas pessoas morriam, desmontaram o Centro de Reabilitações de Rondônia (CERO) para fazer dele um hospital de campanha da Sesau.
Na gestão do ex-governador Confúcio Moura, o CERO veio socorrer a Zona Leste de Porto Velho, face à qualidade dos serviços de reabilitação oferecidos. No primeiro ano, 44% dos atendimentos abrangiam a Zona Leste; outros 33% foram da Zona Sul; e 20% da zona Norte da Capital.
“Era extremamente gratificante ver os olhos das crianças brilhando quando se aproximava o profissional que a iria atender”, diz nesta entrevista o fisioterapeuta Rodrigo Moreira Campos, ex-diretor do CERO e atual presidente do Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (Acre e Rondônia).
O interior começou a enviar pacientes para a Capital. Conforme demonstra o relatório clínico de pacientes, houve casos notáveis de pais e mães que para lá encaminhavam até dois ou três membros da família. Um pai de Candeias do Jamari, por exemplo, carregava uma vez por semana nos braços e nos ombros duas filhas com paralisia cerebral.
O que significa para o senhor ter participado do CERO? A exemplo do Hospital de Base Dr. Ary Tupinambá Pena Pinheiro, referência na Amazônia, ele pode ser visto assim nas áreas de fisioterapia, psicologia e enfermagem?
Participar da construção do CERO é uma das maiores conquistas de minha vida pessoal e profissional. A ideia iniciou de uma reunião entre o Dr. Confúcio Moura, então governador, e o Dr. Yargo Alexandre de Farias Machado, onde discutimos a importância de ter um Centro Referência no Estado de Rondônia, para atendimento a pessoas com deficiência, que sofriam por serem obrigadas a fazer tratamento fora de domicílio. Sofriam, tanto com desgaste físico, quanto financeiro, pois ao mesmo tempo em que perdiam dias de trabalho tinham o gasto familiar dobrado. Inclusive a escolha do nome da instituição ocorreu na Assessoria Técnica da Sesau à época, onde estavam o secretário adjunto, Dr. Luiz Eduardo Maiorquim, Pedro Villar, Dr. Yargo e eu.
De que maneira vocês começaram a trabalhar?
Em 2015, criamos ambiente para atendimento multiprofissional para as crianças com deficiências (intelectual e física), com a presença no mesmo atendimento de profissionais fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos e psicólogos (psicopedagoga). O Governo disponibilizava dois ônibus que realizavam o translado da Policlínica Oswaldo Cruz (POC) até o CERO, e vice-versa. Sete áreas de atividades atenderam a 13,19 mil pacientes, totalizando mais de 16 mil procedimentos até julho daquele ano. Metade dos reabilitados pela Fisioterapia no CERO era formada por acidentados. Houve recordes de atendimento: só em maio de 2015 foram 1.103; em junho 760; e em julho, 923. Tenho certeza, o CERO é e será sempre uma referência para a população rondoniense, pois foi lá que, desde 2015 se organizou melhor o controle e distribuição de meios de locomoção (cadeira de rodas, muletas andadores, cadeira motorizada e afins).
No contato diário com seus pacientes, o que ouvia deles em relação ao modelo criado para atender pessoas com deficiência auditiva, física, intelectual e visual?
Era extremamente gratificante ver os olhos das crianças brilhando quando se aproximava o profissional que iria o atender. Eu ouvia sempre das dificuldades que tinham em serem atendidos pelo poder público, mas quando existiu o CERO isso amenizou as dores de pais, mães e filhos, e as pessoas sentiram conforto. Este modelo de atendimento, mesmo tendo sido aplicado pelo Ministério da Saúde com o Plano Viver Sem Limites, é originário em Rondônia pelo Centro de Reabilitação Belmira Araújo em Ariquemes, do qual também tive satisfação de compor a primeira equipe. Sempre ouvíamos do zelo com a estrutura, equipamentos e o excelente atendimento.
Lembrando que, apesar dos investimentos iniciais, o senhor e o outro diretor, Dr. Yargo Alexandre, reivindicavam sempre a melhor estruturação para socorrer as pessoas. O que conseguiram mais?
Na ocasião tínhamos proximidade com a forma aberta de gestão para o diálogo diretamente com o secretário e as coordenações da Sesau, que realizavam todos os trâmites legais para realizar as aquisições necessárias ao melhor atendimento nas especialidades. Tínhamos estrutura para atendimento de fisioterapia ortopédica com diversos equipamentos, sala de estimulação precoce que possibilitava atendimento de integração sensorial, avaliação auditiva, além dos insumos que constantemente eram necessários.
Constantemente também recebíamos doações de brinquedos pedagógicos e livros para o atendimento de crianças. [Nota: A Sala de Estimulação Sensorial revelava em 2016: 120 mil pessoas têm algum tipo de deficiência em Porto Velho. E o CERO entregava quinhentas cadeiras de roda no interior do estado, estabelecendo regras para receber o benefício.
Há situações de fisioterapia que nos remetem à memória daquele precioso atendimento: 1) havia ônibus para levar pacientes da POC ao CERO; 2) famílias acompanhavam seus entes com diversas situações, incluindo paralisia cerebral e vítimas de AVC; 3) Pilates e acupuntura foram oferecidas às pessoas.
1 – No início do serviço do CERO, durante 1 ano existiu translado com dois ônibus, um da Polícia Militar e outro do Corpo de Bombeiros que faziam a logística entre o CERO e a POC. Foi tempo necessário para que as linhas de ônibus se organizassem, inclusive colocando um ponto final ao lado do Centro de Reabilitação. Além desses ônibus uma Van adaptada para pessoas com deficiência física atendia pessoas buscando no domicílio do paciente e retornando após as consultas.
2 – Era imprescindível a presença dos familiares desde o início do atendimento para compreender o processo de reabilitação até o momento da alta. Todo atendimento do CERO também tinha acompanhamento do setor de serviço social que orientava os cidadãos em relação aos seus direitos e acesso à saúde.
3 – Não havia atendimento de Pilates, porém o CERO atendia também respeitando as prerrogativas e liberdades profissionais. Por exemplo, profissionais que tinham formação e interesse em atuar com a especialidade que houvesse, atuava com ela. Acupuntura é uma atividade que fisioterapeutas executavam no ambiente de atendimento como terapia complementar.
No momento em que São Paulo montava um hospital de campanha dentro do Estádio Municipal do Pacaembu foi correta a “demolição” do CERO para dar lugar a um hospital de campanha na pandemia? Era “extremamente” necessário, ou, com a compra do Hospital Regina Pacis pelo governo, a Sesau poderia ter aguardado um pouco mais?
Na época do início da pandemia realmente foi necessária a disponibilidade de local para adequação de uma unidade que atendesse os pacientes críticos. A boa gestão naquele período deixou uma unidade preparada com tubulação de gases, espaço e estrutura adequado para atendimento de alta complexidade, pois o prédio havia sido construído para ser uma UPA pelo governo do Dr. Confúcio, que novamente pensou grande e proporcionou nessa possibilidade para o povo do Estado.
Logo no início da pandemia, eu mesmo indiquei a estrutura ao gestor da Secretaria. O que precisou ser melhor organizado foi um planejamento de continuidade de atendimento, mesmo que remoto ou domiciliar, para os mais necessitados e planejando o retorno gradual, visto que o Estado fez aquisição de um prédio de hospital privado naquele mesmo período.
Rondônia tem milhares de pacientes vítimas de acidentes de moto e começa a crescer o número de vítimas de problemas de audição, visão e de autismo. O País caminha para meio milhão de cegos e cada vez mais envelhece (conforme a ABO e o IBGE). Qual a responsabilidade de um governo em relação a tudo isso?
Por muito tempo, o modelo de saúde era baseado nos aspectos biológicos. A Organização Mundial da Saúde tem como visão moderna a atenção biopsicossocial, e sendo a saúde do povo brasileiro um dever do Estado, existe a responsabilidade dos agentes públicos. No entanto, Rondônia via-se obrigada a enviar os pacientes a instituições de outros estados. Na gestão do Dr. Confúcio, através da Gerência de Programas Estratégicos da Saúde e da Assessoria Técnica do Gabinete do titular da Sesau fomentou-se a criação de Centros Especializados em Reabilitação em todas as cidades-polo das regionais de saúde, descentralizando esta atenção e permitindo acesso ao atendimento em diversas especialidades.
Essa demanda já existia…
Sim, havia uma demanda reprimida, mesmo com a otimização do fluxo de vagas, o que diminuiu o tempo de espera, porém preocupa além da demanda já existente da unidade as sequelas pós-covid que deve aumentar a procura de atendimentos físicos, respiratórios e mentais. Além de retornar com toda sua energia, o CERO precisa continuar qualificando seus atendimentos com profissionais do quadro do Estado e acompanhando as necessidades atuais da população, ajustando o atendimento através de protocolos operacionais.