O conceito de tecnologia na agricultura muitas vezes se confunde com o uso de máquinas modernas, lançamentos de cultivares e defensivos. Mas o uso de insumos precisa ser complementado pelo manejo correto dos recursos do ambiente para maximizar a produção de grãos. A adoção de tecnologias voltadas à reestruturação do solo tem garantido a tranquilidade dos produtores mesmo em anos de estiagem.
No Brasil, a área manejada com sistema plantio direto, mesmo que com limitações, é de 32 milhões de hectares. No Rio Grande do Sul, o cultivo com espécies anuais produtoras de grãos está presente em 7,57 milhões de hectares, com o sistema plantio direto necessitando de adequações, mas presente em 90% da área.
No verão, predomina a cultura da soja, com 5,69 milhões de hectares, perfazendo mais de 75,2% da área produtora de grãos. No inverno, a produção de grãos está em 1,03 milhões de hectares, o que representa apenas 13,6% da área cultivada. Acrescendo a produção de grãos à área cultivada com adubos verdes ou plantas de cobertura, restam ainda cerca de 5,68 milhões de hectares, isto é, 75% da área sob cultivo de espécies anuais produtoras de grãos ficam em pousio invernal, com presença apenas de plantas espontâneas, como aveia e azevém.
O efeito mais danoso da adoção desta matriz produtiva ou modelo de produção, segundo o pesquisador da Embrapa Trigo, José Eloir Denardin, é a degradação da estrutura do solo, que dificulta ou impede as raízes das plantas de acessar os nutrientes, mesmo diante da aplicação das doses de corretivos e adubos indicadas tecnicamente. Esse fato, conforme o pesquisador, resulta no aumento dos custos de produção e na redução da renda, pois o investimento não se traduz em produtividade.
“É importante destacar que a degradação da estrutura do solo não permite o aprofundamento das raízes, não permite os fluxos de água, de ar e de nutrientes entre as camadas do solo, tornando poucos dias sem chuva (7 a 10 dias), em deficiência, cenário de estiagem, com perda de produtividade e de rentabilidade”, afirma Denardin.
Outro problema está associado à calagem aplicada em solos com baixo teor de matéria orgânica, decorrente do baixo aporte de restos de cultura ao solo. Nessa condição, o processo de compactação do solo é acelerado.
“O calcário, aplicado na superfície de solos com baixo teor de matéria orgânica, normalmente eleva o pH do solo para valores acima de 6,5. Em decorrência, a argila se separa das demais partículas do solo e é arrastada da superfície para a subsuperfície do solo, obstruindo os poros da camada subsuperficial, reduzindo a taxa de infiltração de água, aumentando a erosão hídrica e antecipando os sintomas de déficit hídrico nas plantas”, explica Denardin.
No sul do Brasil, a compactação do solo é responsável por perda de produtividade em três a cada dez safras. Daí a importância em ampliar o uso das práticas conservacionistas capazes de reduzir ou eliminar a compactação, além de aumentar os fluxos de água, de ar, de nutrientes e de raízes no perfil do solo.
SOLUÇÕES
Através de processos mecânicos e vegetativo é possível reverter a degradação e a compactação do solo. É o que mostram os resultados de pesquisas conduzidas pela Embrapa na Região Sul, em parceria com instituições de pesquisa, extensão rural e assistência técnica.
Durante três anos (safras 2017/18, 2018/19 e 2019/20), foram acompanhadas unidades de referência tecnológica em mais de 100 municípios do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Alguns resultados foram expressivos: a produtividade da soja sob forte estresse hídrico foi de 3.458 kg/ha, três vezes maior que a média das lavouras no entorno; o rendimento do trigo sob forte estresse hídrico foi entre 36% e 45% maior; e a taxa de infiltração de água no solo foi de 92 mm/h na área em que foram combinadas práticas mecânicas e de diversificação de culturas, enquanto em área sem estas práticas, a taxa de infiltração foi de 13 mm/h.
O processo mecânico de descompactação de solo está fundamentado na escarificação, que consiste em romper a camada compactada através de equipamentos motomecanizados que operam em profundidade ligeiramente maior do que o limite inferior da camada compactada.
O processo vegetativo de descompactação do solo está associado ao desenvolvimento de raízes de plantas, cujo sistema radicular seja suficientemente vigoroso, agressivo, intenso e espesso para penetrar e romper a camada compactada, deixando, após sua morte e decomposição, macroporos no solo.
“O uso de plantas com raízes em alta densidade, espessas, finas e que se decomponham lentamente constitui complemento essencial à ação mecânica de descompactação, uma vez que as raízes ocuparão os espaços resultantes do rompimento da camada compactada”, explica o Chefe de Transferência de Tecnologia da Embrapa Trigo, Jorge Lemainski. As melhores opções são as gramíneas de verão, como milho, capim sudão, milheto ou sorgo, seguidas pelas gramíneas de inverno como centeio, aveia branca, aveia preta, triticale, trigo e cevada.