“Tudo que é perfeito a gente pega pelo braço, joga ela no meio, mete em cima, mete em baixo. Depois de nove meses você vê o resultado”, essa frase, da música do grupo de axé ‘É o Tchan’, serve como comprovação de que a naturalização de canções com abordagens abusivas é normalizada e aceita pela sociedade, e isso desde décadas atrás, e que tal realidade não se aplica apenas aos gêneros musicais atuais.
Esse cenário tem origem e persistência inegável do machismo estrutural presente nas suas mais variadas formas, já que letras como essa são abertamente cantadas por cidadãos brasileiros, independente de idade, sem uma análise da problemática da mensagem que o artista transmite. Juntamente a essa realidade, contribuem para a violação, por meio musical da mulher, uma sociedade que consome esse produto e a identificação por parte da população masculina.
É evidente que uma sociedade que consome letras abusivas sem perceber, junto com o machismo estruturado, contribuem para a persistência das agressões musicais contra a mulher. Isso ocorre porque letras depreciativas são relevadas por conta do ritmo da música, já que para um grupo de pessoas curtirem, é mais interessante ouvirem uma música com um beat pesado e uma letra subliminar, do que outra em que a letra é predominantemente respeitosa, mas com um ritmo ameno.
“Ninguém vai sair violentando mulheres só porque escuta essa música”, são palavras de homens que consomem esses sons abusivos, mas o questionamento é se esse homem realmente sabe respeitar uma mulher, já que ao mesmo tempo em que canta violência explícita sabendo que é errado, nada garante que ele não reproduza violência implícita e releve esse seu abuso.
Além disso, a identificação de ouvintes com essas músicas, junto com um estrutural machista, favorece a continuidade das mensagens agressivas. Isso acontece porque muitas pessoas, predominantemente homens, se identificam com os acontecimentos das letras musicais, que muitas das vezes também são escritas por outros homens e que provavelmente passaram pelas experiências abusivas contadas.
Essa identificação favorece o mercado que usa dessa forma musical, já que há um consumo excessivo pelos ouvintes que veem a mulher como submissa e inferior. Esse fato é comprovado pela pesquisa de Tobias Greitemeyer em 2015, na Áustria, na qual foram apresentados dados que mostraram que as letras machistas podem reforçar o comportamento agressivo de um homem contra a mulher, pois, conforme a pesquisa, eles tendiam a expressar mais desejos de vingança quando estavam ouvindo músicas machistas.
Desse modo, sabe-se que a mensagem musical que agride a mulher baseia-se no estrutural machista em que se vive durante todos os anos. Sendo assim, para solucionar esse quadro, é necessário que o Legislativo elabore um projeto de Lei, a ser votado no Congresso, a fim de punir artistas e produtoras que lancem músicas com letras de teor agressivo e objetificante da mulher, mediante denúncias públicas.
Dessa forma, devem ser multados todos os que propagam violência contra o gênero feminino em suas letras, além de ser obrigatória a retirada da música das plataformas. Além disso, é de responsabilidade individual a autocrítica e avaliação de cada cidadão sobre as músicas que escreve, escuta e a forma como ela molda a própria identidade, o comportamento, e principalmente as ações com as mulheres da sociedade, onde a luta pela igualdade ainda está bem longe de ter um descanso.
Valeska Maria Ferreira Galvão, aluna do 3º ano do curso técnico em agropecuária integrado, Ifro-campus Colorado do Oeste