Advogado, jornalista, apresentador de rádio e televisão, Lúcio Lacerda já ocupou os cargos de Secretário Municipal de Cultura e de Procurador Geral de Município, e hoje se destaca em uma nova modalidade de ativismo político nas redes sociais, ficando conhecido fora das fronteiras da cidade de Cacoal, onde reside, com programas de Web TV e “tretas de WhatsApp”.
Após receber convite, se filiou ao Solidariedade e anunciou pré-candidatura a deputado estadual. Na entrevista concedida ao Extra de Rondônia, Lúcio faz um breve resumo de sua chegada a Cacoal e analisa a atual conjuntura política em Rondônia.
EXTRA DE RONDÔNIA – Sabemos que o senhor é egresso de Minas Gerais, e que, como muitos cidadãos do nosso Estado, decidiu residir em Cacoal. Conte um pouco sobre essa escolha de vir viver em Rondônia.
LÚCIO LACERDA – Na verdade, eu sou de uma região de Minas Gerais, onde as pessoas têm um espírito de movimentar-se, ou de “ir pro trecho”, como se diz em Teófilo Otoni, que fica pertinho de Governador Valadares, cidade que mais “exporta” brasileiros para os Estados Unidos. Tenho muitos parentes que já foram morar no estrangeiro, e, eu próprio, já vivi na Europa alguns anos, e também em várias cidades do Brasil, por motivo de trabalho ou de estudo. Com essa disposição para enfrentar o novo e o desconhecido, aceitei, anos atrás, quando vivia em Belo Horizonte, um convite de um empresário das comunicações daqui de Rondônia, para vir trabalhar em rádio e TV na cidade de Cacoal. Depois conhecer o município, aceitei o convite e radiquei nessa cidade sensacional. Atualmente, uns dizem que sou um forasteiro, que caiu de um caminhão; outros, que sou uma pessoa útil para a sociedade rondoniense. Mas o certo mesmo é que 100% da água que corre em meu corpo é água do Rio Machado.
EXTRA – Embora você se apresente como uma pessoa de esquerda, esteve engajado em 2020 em campanhas eleitorais de pessoas de partidos de direita. Como foi isso?
LÚCIO – Em 2020 houve uma grande instabilidade política no município. Eu temia que um candidato muitíssimo jovem e inexperiente viesse a ser eleito prefeito, o que de fato ocorreu, e então, naquela situação, o mais salutar seria que apoiasse a Glaucione (ex-prefeita), que na época era um governo que estava funcionando, e chegando ao final do mandato com resolução de uma série de problemas que incomodavam a população, como a questão dos buracos na cidade. Não era difícil fazer uma escolha na época: escolher entre alguém como Glaucione, que tinha formação em gestão pública e que tinha galgado um caminho político de vários mandatos bem sucedidos e um jovem que, ao que tudo indicava, não sabia muito bem o que iria fazer se fosse eleito.
Não havia na época nenhum quadro de esquerda viável para as eleições municipais, e essa questão de esquerda e direita nem sempre é bem entendida pela população. Às vezes é preciso votar nas pessoas, acima dos rótulos. Depois veio a crise e a ex-prefeita foi afastada de seu cargo, desistindo da candidatura, e sendo sucedida por Marco Aurélio Vasques, à época filiado ao DEM. Vasques é um técnico e na altura era sem nenhuma dúvida a pessoa mais preparada para assumir a prefeitura. Por esta razão, eu estive engajado na campanha dele.
EXTRA – Contudo, agora, Glaucione e Vasques também são pré-candidatos à Assembleia Legislativa de Rondônia (ALE). Você os consideraria adversários políticos?
LÚCIO – Não vejo dessa forma. Não considero nenhum dos dois como adversários. Gosto de ambos, respeito e os admiro. Ademais, essa é uma fase de pré-campanha, que ainda não torna certa uma disputa. É apenas uma manifestação de vontade, mas tudo depende dos partidos e suas convenções. Acho que Glaucione e Vasques são excelentes quadros para o parlamento rondoniense, com muita experiência. Mas eu tenho uma coisa que eles não têm: uma visão externa sobre o Estado de Rondônia, tendo por balizas muitas experiências que adquiri vivendo no Sudeste. Eu penso que Rondônia é um Estado tão rico e tão viável, que seus indicadores econômicos deviam concorrer com grandes Estados do Sudeste, e não apenas liderando na região norte.
EXTRA – O que você acha que falta em Rondônia para que o Estado tenha mais protagonismo nacional?
LÚCIO – Acho que, de saída, é preciso aos políticos do estado, mais abstração e imaginação. Ter pautas bem definidas e a capacidade de ver a floresta e não apenas a árvore. Se você reparar bem, verá que muitos deputados atuam em pequenas demandas, contingências pontuais e conduzem seus mandatos sob premissas muito genéricas. A maioria dos parlamentares destaca seus mandatos através de pequenos favores do executivo, com indicações e emendas, o que de certa forma acaba por submeter o legislativo ao governo da situação. O legislativo é muito maior que isso. O legislativo pode abraçar os grandes temas da política, propor projetos de modifiquem e melhorem o desempenho econômico do Estado, e melhorar os projetos de iniciativa do poder executivo. A política não pode ser tocada só no varejo. Tem que consertar a ponte, tapar o buraco, mas em algum momento é preciso resolver os problemas do sistema dentro do qual as pontes caem e os buracos são abertos. Uma coisa é falar de uma rodovia estadual, outra é enxergar todo o complexo aparato viário de que um Estado depende para que haja mobilidade de pessoas, bens, mercadorias. Uma coisa é eu ir descansar e me divertir em um dos maravilhosos balneários que existem em Rondônia, outra é eu olhar para o céu mais bonito do Brasil e decidir compartilha-lo com o restante do país, desenvolvendo a economia do turismo, praticamente inexistente no Estado. A formidável e variada geografia de Rondônia permite que se criem circuitos turísticos ecológicos, de selva, de pesca e até onde a imaginação quiser levar. Milhares de pessoas embarcam das grandes capitais todos os anos em aeronaves com destino ao pantanal, para pescar, mas eles não conhecem o Guaporé, porque nem Rondônia parece admitir o seu potencial.
EXTRA – Você não acha que os políticos preferem atuar no varejo porque essas pequenas coisas do dia-a-dia são mais visíveis aos olhos dos eleitores?
LÚCIO – Certamente que sim. Mas isso é um erro a longo prazo. Os políticos devem procurar se associarem a princípios, sob pena de caminhar para o esquecimento. Quem é o deputado dos direitos humanos em Rondônia? Qual é o da segurança pública? Da educação, da cidadania e do orgulho de ser rondoniense? Há muitos caminhos e grandes pautas as quais a pessoa política pode se associar, e pode se associar a mais de uma pauta e bandeira. As pessoas são eleitas com a plataforma genérica de “fazer o melhor para o povo rondoniense” e, no final, ninguém sabe quem está lá em cima nem a que interesses servem.
EXTRA – Exemplifique um grande tema que você considera que deveria ter sido objeto de atenção do legislativo rondoniense.
LÚCIO – São muitos temas. Muitos mesmo. Mas citando o que me vem a memória neste instante, eu acho que o transporte público é uma área em que Rondônia destoa de todo o Brasil. Tanto no âmbito municipal, quanto estadual, Rondônia não revolve questões de transporte público. “Todo mundo tem uma motinha”, dizem, e com essa justificativa segue-se a vida sem discutir transporte público. Nem ônibus, nem trem, nem ciclovias e até o deslocamento aéreo é complicado por aqui. A razão é simples: os políticos acham que esse problema de transporte não existe. E se não existe, não precisa ser resolvido. Posso, ainda, citar a obsolescência do Estado no que se refere a informatização dos processos públicos, que aqui se dá por um sistema que inibe a participação do público externo, e no Estado de Rondônia não se consegue encontrar um texto de lei compilado ou consolidado, porque não informatizaram as leis do Estado. Aqui, você procura um texto de lei a encontra um arquivo PDF, com o texto original, sem nenhuma alusão a modificações, revogações, legislação conexa, acréscimos ou eventual decisão sobre a constitucionalidade do dispositivo. Informatizar a informação pública é uma prioridade para um ente que queira ser competitivo. Rondônia precisa discutir mineração, auto-regulamentação dos povos indígenas, energia. Os parlamentares do Estado não estão adstritos apenas aos temas de sua competência exclusiva não. Uma liderança política tem que estar antenada em tudo que for do melhor interesse de seu estado, e pode e deve atuar em articulações e composições com outras esferas do poder para melhorar a vida do povo. Para todo o povo. Trabalhadores, empreendedores, agricultores, servidores, aposentados.
EXTRA – Você é advogado. Há possibilidade de você obter o apoio da classe dos advogados?
LÚCIO – Olha, como eu disse, esse é um momento de pré-candidatura, não há uma candidatura posta, mas apenas o desejo de ser aprovado em convenção. Naturalmente que neste lugar do tempo, não há divulgação de apoios, por ser a candidatura uma possibilidade e não um fato. Mas, de antemão, posso dizer que a OAB, em regra, não costuma endossar candidaturas de advogados, em razão de haver quase sempre vários colegas advogados se apresentando como candidatos. Mas, se a candidatura se consolidar, eu penso que há diversas pautas políticas que interessam a classe.
Sobre isso, o Estado de Mato Grosso tem um belo exemplo a nos dar. Lá, a constituição garante a gratuidade do Mandado de Segurança, instrumento jurídico tão importante para a defesa dos direitos das pessoas.