A jovem Maria José Rabelo Almeida veio morar em Vilhena em 1963. Tinha 22 anos. Quando chegou de Minas Gerais, estava casada havia apenas três dias.
Ela era a única mulher casada que vivia no acampamento do DNER (Departamento Nacional de Estradas de Rodagem), e aqui permaneceu até 1968.
Seu futuro marido, Hesly de Almeida e Silva, tinha chegado antes, por volta de 1960, e foi o primeiro topógrafo responsável pela BR-29, atual 364, no trecho entre Vilhena e Pimenta Bueno. Ele faz parte do desbravamento da região, pois foi essa rodovia que proporcionou a onda migratória que ocupou Rondônia e fez surgir várias cidades em seu entorno.
Depois de 55 anos distante, dona Maria José voltou a Vilhena para uma visita de três dias, nesta semana, acompanhada de sua filha, a bióloga e advogada Jane, que quando saiu daqui tinha apenas três anos. Era a caçula. A outra filha do casal, Giovana, nasceu ainda em 1963 e foi a primeira criança a viver nas dependências do acampamento do DNER. Todos a tratavam como princesa.
Quando Maria José saiu daqui, Vilhena não era sequer distrito administrativo — o que só ocorreu em 1969. Somente em 1977 foi elevado à cidade. Ela conta das dificuldades: lavava roupas no igarapé e os gêneros alimentícios vinham de avião, de Cuiabá. Médico visitava a comunidade uma vez por mês; era o doutor Leônidas Rachid, mato-grossense que mais tarde virou deputado por Rondônia. A moradora teve febre amarela e, para dar à luz, precisou viajou para Minas.
Dona Maria decidiu voltar para sua terra depois de um ataque de indígenas à estação telegráfica (Casa de Rondon), a 5 km do acampamento, em que um funcionário do DNER acabou flechado e morto. Isso a deixou apreensiva e ela embarcou no dia seguinte ao caso, levando suas meninas.
No entorno da vila militar havia notícias de ataques de indígenas cintas-largas, revoltados com a presença de garimpeiros de cassiterita que estavam ocupando suas terras na região de Pimenta Bueno.
Seu marido ainda ficou durante mais um tempo, e logo pediu transferência. Ele se desligou do DNER na década de 1970, e se aposentou em 1993 na Mendes Júnior, mas continuou requisitado por grandes corporações. Era tido como profissional de excelência.
Dona Maria José tornou-se professora de História. Aposentada há 12 anos, sempre teve o desejo de voltar a Vilhena. Ficou emocionada ao reencontrar antigos moradores — a exemplo do sargento da FAB Aymoré Pereira e Toschio Kameya, também antigo funcionário do DNER — e rever a sede do acampamento, no bairro 5º BEC, com uma casa de 1964 ainda hoje intacta. E também admirou o progresso da cidade ao longo do tempo. “Fiquei surpresa, positivamente”, resumiu.
UMA LINDA HISTÓRIA
Culta e com memória invejável, aos 82 anos, dona Maria José é um exemplo de superação e coragem. Depois que deixou Vilhena, em 68, teve outros dois filhos e cursou magistério com mais de 50 anos de idade; começou a lecionar para o ensino fundamental.
No ano 2000, ela passou a cursar História, concluiu a faculdade aos 65 anos e passou a a dar aulas para o ensino médio, até os 70 anos. Seu apreço pela história fê-la preservar as memórias de Vilhena.
Àquele tempo inicial ela tinha máquina fotográfica e registrava a movimentação na região, e algumas vezes viajava com o marido, de Jeep Willys, para os trechos do território de Rondônia em que ele estava a trabalho e pôde ter contatos com seringais.
Também teve que viajar muito pelo Brasil por conta dos trabalhos do marido, por isso se formou só quando ele se aposentou. Nunca se esqueceu de Vilhena. Seu companheiro também sonhava um dia voltar, mas acabou falecendo em 2007.
A família mora há 30 anos em Governador Valadares (MG) e guarda muitas relíquias — fotos, cartas e documentos — que registram o nascimento da vila de Vilhena.