Nas últimas semanas, governo federal e Congresso Nacional passaram a discutir novas regras para o setor de apostas esportivas, incluindo aumento de tributos e restrições publicitárias. As propostas vêm na esteira de duas polêmicas diferentes: o aumento de alíquotas do IOF, anunciado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e a CPI das Bets no Senado.
Apesar das intenções da classe política, especialistas e representantes da indústria alertam que o efeito colateral pode ser o oposto do desejado. Apertar demais as condições para as operadoras legais pode levar um impulso ao mercado ilegal, onde não há fiscalização, regras ou segurança para o consumidor que passar a jogar em uma casa de aposta sem verificação.
Entre as propostas em análise está o aumento da alíquota do GGR (Gross Gaming Revenue) de 12% para 18%, o que elevaria a carga tributária total das empresas reguladas para até 56,25%, segundo estimativas do Instituto Brasileiro Jogo Legal (IJL).
Além disso, o Projeto de Lei 2.985/2023, aprovado no Senado e aguarda votação na Câmara dos Deputados, pretende impor aumentar a restrição de propagandas de apostas esportivas. As medidas vão desde horários limitados para a publicidade do setor até a proibição da participação de influenciadores e atletas ativos.
Outro ponto polêmico é o projeto de lei proposto pelo deputado Célio Studart (PSD-CE), que propõe elevar a CSLL para 50% sobre os rendimentos de influenciadores e produtores de conteúdo que promovam apostas online. A justificativa é destinar os recursos à saúde mental e ao piso da enfermagem, combatendo o que o parlamentar vê como “fomento à ludopatia”.
Contudo, essa medida pode ter o efeito colateral de afastar profissionais sérios voltados às apostas, que produzem tanto conteúdo educativo sobre o setor quanto oferecem palpites de especialistas.
A justificativa oficial das propostas é proteger a população contra os riscos do jogo excessivo, mas setores da indústria consideram os projetos desequilibrados e de impacto potencialmente destrutivo. Para o presidente do IJL, Magnho José, o cenário desenhado pelas propostas é alarmante para as bets e para o esporte brasileiro, que tem recebido investimentos de patrocínios das casas de apostas.
“Elevar a tributação do GGR para 18% pode ser devastador para a saúde financeira das plataformas de apostas de quota fixa e jogos online regulamentadas”, afirma Magnho. Segundo ele, a combinação de impostos federais, como IRPJ, CSLL, PIS e COFINS, somados ao ISS municipal, já coloca as empresas sob uma carga de até 50,25%. Com o novo aumento, esse número pode ultrapassar os 56%.
Magnho critica o que chama de “estelionato regulatório das bets”, ao afirmar que operadoras que apostaram no novo mercado regulamentado agora se veem traídas por mudanças inesperadas e onerosas. Ele enfatiza que uma tributação tão agressiva só favorece a casa de aposta sem verificação, pois as plataformas ilegais não enfrentam essa carga fiscal e podem oferecer premiações mais atrativas, além de operar com maior liberdade publicitária.
Argumento similar é aplicável a quem trabalha com conteúdos e palpites de especialistas. Ao encarecer ou inviabilizar a presença desses profissionais nos canais mais confiáveis, cresce o espaço para golpistas que se aproveitam de plataformas como Telegram e grupos de WhatsApp para oferecer “dicas infalíveis” sem qualquer credencial ou responsabilidade, muitas vezes também encaminhando os apostadores para uma casa de aposta sem verificação.
A situação é particularmente mais grave pela parcela do público que recorre aos palpites de especialistas como forma de orientação antes de apostar. Cerca de 46% dos apostadores citam o Youtube como fonte de informação sobre o assunto, com 29% mencionando também Telegram e WhatsApp, de acordo com pesquisa publicada pela ENV Media.
Frente ao avanço do Projeto de Lei 2.985/2023, a Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL) e outras entidades do setor encaminharam um pedido formal à Câmara dos Deputados para que a proposta seja debatida nas comissões antes de ir ao plenário. O objetivo é “desacelerar a tramitação e permitir alterações no texto”, principalmente nas regras sobre publicidade, consideradas excessivamente restritivas.
Entre os pontos mais contestados estão a proibição de veicular anúncios durante transmissões ao vivo, restrições à exibição de odds em tempo real e a limitação do uso de influenciadores e atletas. As entidades argumentam que essas regras dificultam a concorrência entre uma bet autorizada e uma casa de aposta sem verificação, que opera sem obedecer aos mesmos limites e obrigações.